domingo, 19 de julho de 2020

Falas desejantes de personagens reais de um isolamento mundial

                                                                                        

Glaucos Luis F. Monteiro[1]

     

O presente texto trata-se da reflexão de uma atividade surgida das discussões geradas na disciplina Tópicos Especiais em Poéticas Contemporâneas: “Atrações Temporárias e Estéticas Emergentes nas Cidades”, a partir de março de 2020, sob a orientação da Prof.ª Dra. Maria Thereza Azevedo, do Programa de Pós-graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (PPG-ECCO) da Universidade Federal de Mato Grosso.

A atividade, um grande levantamento realizado de forma totalmente digital e segura para todos envolvidos, recolhendo vídeos para saber o que as pessoas estão sentindo neste isolamento social e o que acreditam ser possível ou necessário mudar num momento “pós-pandemia”, iniciou-se justamente no início do isolamento social causado pela disseminação planetária da Covid-19, também em meados de março desse mesmo ano (2020).


                       

Após a finalização dos vídeos, ficou decidido que os mesmos estariam sendo publicados em diferentes plataformas digitais, para maior alcance e divulgação, o que tem sido realizado ainda nesse momento (julho de 2020).

Em se tratando de uma pesquisa acadêmica, podemos dizer que se trata de uma pesquisa de campo onde os entrevistadores levantaram dados sobre o que as pessoas estão sentindo nesse momento. Todavia, as falas das pessoas entrevistadas não são apenas dados acadêmicos, mas depoimentos de como toda essa situação iniciada no primeiro terço de 2020 vem afetando indivíduos, famílias, grupos sociais, etc.



Numa proposta mais descolonizante, e particularmente atraente para esse autor, poderíamos dizer que seja mais uma “pesquisa de afetos” e verificação de “possibilidades ou ‘campo de possíveis’ que estão ligados a um acontecimento como ponto focal de invenção social, de criação de mundos possíveis, momento de inauguração do processo de experimentação” (GONÇALVES, 2020), conforme proposto pela pesquisadora do PPG-ECCO, Naiane Gonçalves.




Importante ressaltar que as atividades realizadas anualmente pela disciplina da professora Maria Thereza Azevedo, fazem parte de uma proposta maior intitulada “Cidade Possível” que:

compreende o espaço da cidade como o campo de construção da vida social enquanto um circuito de afetos. O espaço como possibilidade de mobilização de ideias, pessoas e experiências que podem criar conexões e redesenhar as condições de participação e apropriação. O espaço como agenciador de subjetividades para uma reinvenção da vida. (AZEVEDO 2017, 14)


Ao mesmo tempo que a realidade do isolamento social tem sido um transtorno infindável para muitas pessoas, impedindo uma possível saudável troca de informações e afetos que (geralmente) acontecem nas reuniões sociais, sejam elas familiares, acadêmicas, culturais, etc., impediu também a realização de alguma performance pública presencial durante o período da realização da referida disciplina ofertada pelo PPG-ECCO/UFMT.

Não obstante, as reflexões e propostas surgidas durante as aulas (on-line), aliadas as necessidades de dar novos sentidos as relações possibilitadas pelas tecnologias digitais de comunicação nesse momento, ampliaram a possibilidade de inclusão de outros “atores” na atividade 2020, como pessoas de outras cidades ou países, por exemplo. Dessa forma, faz-se necessário citar o sentimento compartilhado pela pesquisadora, Maidi Leonice Dickmann (ECCO-UFMT), onde ela percebe que “é um momento de acreditar que não somos marionetes e não estamos acorrentados. Estamos nos fortalecendo para ter outras possibilidades de vida”. (DICKMANN, 2020).



Destarte, mais do que um momento de desanimo ou abatimento, apesar de todo o bombardeio permanente de más notícias – seja da situação da saúde pública, seja pela falta de uma política concreta de gestão da crise ou o evidente descaso governamental para com a gravidade da situação – também podemos ver esse como um momento de possibilidades.

A exemplo disso, a pesquisadora Karina Figueredo Souza (ECCO-UFMT), comentando sobre um novo prazer adquirido durante o isolamento social, seu primeiro pé de manjericão, e ainda citando reflexões da atriz Denise Fraga, propõe a seguinte reflexão:

(...) pensarmos a pandemia como um terremoto que aconteceu nas nossas vidas, e que necessariamente, ele vai tirar as coisas do lugar. Neste caso, então, uma abertura de possíveis é manter-se firme, disciplinado, “consciente de que é um sacrifício mesmo, e que ele é necessário, para quem sabe um dia se chegar a uma renovação”. Logo, podemos pensar que está tudo bem se tivermos, por enquanto, muito mais perguntas, que respostas. Em um mundo em que portas se fecham, que janelas se abrem? Quantos outros pés de manjericão podemos plantar?  (SOUZA, 2020)


Os vídeos que obtive com o depoimento de algumas pessoas que puderam adotar o isolamento social apontam bastante nessas direções: do algo melhor a surgir, a ser construído tanto individualmente quanto coletivamente.

Concordando com a advertência proposto pela pesquisadora Madalena Nunes, do PPG-ECCO/UFMT, quando cita a escritora nigeriana Chimamanda Adichie, nos incentivando a pensar sobre “a necessidade de observar múltiplas possibilidades de desfechos”, e ainda permanecendo alerta “para a necessidade de nos mantermos abertos à multiplicidade de narrativas, vivencias, lugares de fala” (NUNES, 2020), apresento as entrevista obtidas:

Numa possível sistematização podemos descrever doze (12) pessoas escolhidas (3 professoras, 3 pessoas ligadas a questão indígena, 5 pessoas com alguma ligação nas artes, 1 servidor aposentado); ainda acatando as recomendações propostas por Madalena Nunes (2020), sugerimos que os depoimentos possam ser vistos como trocas de experiências que possam “ser usadas para capacitar, humanizar e trazer de volta a esperança” (NUNES, 2020).

Por conta do perfil de pesquisador/artista, também foi produzido uma poética musical com a minha proposta de utopia pós-pandêmica.


Parafraseando a proposta/desafio da pesquisadora do PPG-ECCO Claudyanne Rodrigues de Almeida, quando conclui que “Esse é o ano que para além de gestarmos a mudança, nos tornamos a mudança” (ALMEIDA 2020), fugindo de enfadonhos clichês acadêmicos, mais do que possíveis análises das falas, optei por dar visibilidade às mesmas e deixar as (in)conclusões para visitantes do nosso Blog manifesto Mundos Possíveis.






 

Referências, Obras Citadas ou pesquisadas:

 

ALMEIDA, Claudyanne Rodrigues de. "SONHOS POSSÍVEIS: GESTANDO UM NOVO PULSAR PARA PESTE DO MUNDO ." Mundos Possíveis. 2020. https://possiveismundos.blogspot.com/2020/07/sonhos-possiveis-gestando-um-novo.html (accessed 2020).

AZEVEDO, Maria Thereza. "Cidade Possível, ou, como podemos criar outros modos de estar no mundo." In Cidade Possível - Pensar, Experimentar e reencantar a cidade, by Maria Thereza AZEVEDO (Org.). Curitiba: CRV, 2017.

DELEUZE, Gilles, and Félix GUATTARI. Mil platôs. São Paulo: Editora 34, 1996.

DICKMANN, Maidi Leonice. "NÃO SOMOS MARIONETES. NÃO ESTAMOS PRESOS POR COLEIRAS ELETRÔNICAS. HÁ OUTRAS POSSIBILIDADES DE VIDA ." Mundos Possíveis. 2020. https://possiveismundos.blogspot.com/2020/07/naosomos-marionetes_17.html.

GONÇALVES, Naiane Silva. "OS DESAFIOS DE UM MUNDO POSSÍVEL PÓS-PANDEMIA." Mundos Possíveis. 2020. https://possiveismundos.blogspot.com/2020/07/osdesafios-de-um-mundo-possivel-pos.html?zx=67d9a54f2c4cda0a.

LAZZARATO, Maurizio. As revoluções do capitalismo. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2006.

MAGNAVITA, Pasqualino Romano. "Cidade, cultura, corpo e experiência." Revista Redobra., 2012: v. 10 p.27-32.

NUNES, Madalena. "Sobre incertezas e empatia ." MUNDOS POSSÍVEIS. 2020. https://possiveismundos.blogspot.com/2020/07/sobre-incertezas-e-empatia.html.

SOUZA, Karina Figueredo. "MUNDO POSSÍVEL PÓS-PANDEMIA: CONEXÕES FEITAS A PARTIR DE UM PÉ DE MANJERICÃO ." MUNDOS POSSÍVEIS. 2020.

 

 



[1] Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea/ECCO/UFMT; Músico & Radialista.

Um comentário:

  1. A experiência foi muito válida, ajudou a compreender este período impar que estamos vivendo e refletir sobre o novo normal.

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